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“Ser Mulher é uma Força, não uma limitação”

Num mundo em constante transformação, onde as exigências da liderança se moldam cada vez mais ao equilíbrio entre resultados e impacto social, a presença feminina assume um papel determinante. É neste contexto que Ana Moreira, médica, empreendedora e impulsionadora da Medicina Integrativa em Portugal, tem vindo a deixar a sua marca com coragem, sensibilidade e uma visão clara de futuro.
Fundadora do Centro de Medicina Integrativa Dra. Ana Moreira e Presidente da Sociedade Portuguesa de Medicina Integrativa, é hoje uma voz incontornável na promoção de um modelo de saúde mais holístico e centrado na pessoa. Mas é também, e cada vez mais, uma referência no universo da liderança feminina, desafiando estereótipos, abrindo caminhos e provando que é possível conciliar ciência, humanismo e gestão com excelência.
Nesta entrevista à Business Voice, Ana Moreira reflete sobre o seu percurso, o papel das mulheres na liderança — sobretudo em áreas tradicionalmente dominadas por homens — e a importância de criar redes de apoio, espaços de crescimento e ambientes onde liderar não signifique abdicar da autenticidade. Fala ainda sobre os desafios e conquistas de liderar num setor exigente como o da saúde, e da urgência de integrar diferentes saberes para construir soluções mais completas, humanas e eficazes.
Com uma abordagem inspiradora e profundamente consciente, Ana Moreira representa uma nova geração de líderes que acreditam que cuidar, educar e transformar são atos políticos — e que a liderança feminina, mais do que uma tendência, é uma necessidade social e ética.

No sentido de contextualizar o nosso leitor, o que a motivou a fundar o Centro de Medicina Integrativa e que balanço perpetua da atividade do mesmo, apresentando ainda as mais-valias que apresenta?
A fundação do Centro de Medicina Integrativa nasceu de um desejo profundo de oferecer uma abordagem mais completa, humana e personalizada ao cuidado em saúde. Sentia que a medicina convencional, embora essencial, muitas vezes não respondia de forma plena às necessidades emocionais, nutricionais e funcionais dos pacientes. 
O balanço é extremamente positivo: ao longo dos anos, temos acolhido milhares de pessoas (mais de 16 mil) com histórias únicas e necessidades complexas, que encontraram na nossa equipa um espaço de escuta ativa, diagnóstico integrado e intervenção holística. 
As principais mais-valias passam por esta visão multidisciplinar, pela personalização dos planos terapêuticos e por uma forte aposta na educação do paciente como agente ativo da sua saúde.

Na sua visão, quais são as principais características que distinguem uma liderança feminina no contexto da saúde e do bem-estar?
A liderança feminina tende a ser mais empática, colaborativa e intuitiva. No contexto da saúde e do bem-estar, estas características são particularmente valiosas, pois favorecem uma escuta mais profunda, um cuidado centrado na pessoa e uma maior valorização da interconexão entre equipas. 
A liderança feminina não se baseia apenas na autoridade, mas sobretudo na construção de relações significativas, no acolhimento das emoções e na capacidade de manter o foco mesmo em ambientes de elevada exigência emocional.
Mas eu sou uma mulher altamente inclusiva. A liderança masculina também é fundamental em cooperação com o resto das equipas.

Quais foram os maiores desafios que enfrentou enquanto mulher a construir e gerir uma clínica de referência e prestígio?
Um dos maiores desafios foi conciliar a profundidade da visão clínica com as exigências da gestão empresarial, num universo ainda muito marcado por estruturas tradicionais e masculinas. Tive de conquistar o meu espaço, provar constantemente a minha competência e, por vezes, lidar com o ceticismo de quem não compreendia ou valorizava uma abordagem mais integrativa da saúde. Além disso, houve o desafio pessoal de equilibrar dedicação profissional com a vida familiar e com a preservação do meu próprio bem-estar.

Acredita que o mundo empresarial e clínico está hoje mais aberto à liderança exercida por mulheres? Porquê?
Sim, acredito que há uma mudança positiva em curso. As mulheres estão cada vez mais a ocupar espaços de decisão e a demonstrar que a liderança pode – e deve – ser exercida com empatia, inteligência emocional e visão estratégica. No entanto, ainda há um caminho a percorrer. Muitas estruturas continuam assentes em modelos antigos, e a presença feminina em cargos de topo na saúde ainda não reflete a realidade da base, onde as mulheres são maioria. A mudança requer não apenas presença, mas também influência e representatividade.

Como concilia a exigência da direção clínica com a sua vida pessoal e familiar? A liderança feminina traz uma abordagem diferente neste equilíbrio?
A conciliação é um exercício diário de presença, prioridades e autocuidado. Chega a haver um esforço sobre-humano com a tentativa de equilíbrio. Aprendi que é impossível estar em todo o lado com igual intensidade, e que delegar, confiar na equipa e respeitar os meus próprios limites são formas maduras de liderar. Acredito que a liderança feminina traz, sim, uma sensibilidade acrescida para esse equilíbrio. Muitas vezes somos simultaneamente líderes, mães, filhas, companheiras — e isso ensina-nos a importância da organização emocional e da flexibilidade.

Que conselho daria a jovens mulheres que aspiram a assumir papéis de liderança, sobretudo em áreas tradicionalmente dominadas por homens?
Diria para acreditarem profundamente no seu valor e na sua visão. O caminho nem sempre será fácil, mas é justamente nas adversidades que se revela a força da liderança. Procurem mentoras, cultivem redes de apoio, e não tenham receio de ocupar o espaço que lhes pertence por mérito. Sejam firmes, mas humanas. Técnicas, mas sensíveis. E lembrem-se de que ser mulher é uma força, não uma limitação.

Ao longo da sua carreira, houve alguma figura feminina que a tenha inspirado de forma marcante? Que ensinamentos guarda dessa influência?
Sim, ao longo da minha jornada fui inspirada por várias mulheres – médicas, terapeutas, líderes, pacientes.
Mas sem dúvida que a figura feminina que mais me inspirou foi a minha mãe. É uma mulher extraordinária, que liderou durante muitos anos uma empresa com centenas nas de funcionários, enfrentando os desafios do mundo empresarial numa época em que a presença feminina na liderança era ainda mais rara e após a morte do meu pai, que era o gestor. 
Com ela aprendi a força do trabalho, a importância da consistência, a coragem de tomar decisões difíceis e, acima de tudo, o valor da integridade. A sua capacidade de conciliar firmeza com empatia marcou profundamente a minha forma de estar na vida e de liderar. É dela que herdei a convicção de que uma liderança eficaz pode — e deve — ser exercida com humanidade.

Como inspira e motiva a sua equipa? Acredita que o exemplo ainda é a melhor forma de liderar?
Acredito profundamente no poder do exemplo. Liderar é, antes de tudo, ser coerente: entre o que se diz e o que se faz, entre o que se pede e o que se vive. Tento inspirar a minha equipa através da escuta, da partilha de propósito e do reconhecimento constante do valor de cada um. Quando há uma cultura de respeito mútuo e clareza de missão, a motivação emerge naturalmente.

O sucesso, para si, mede-se por que critérios? E sente que a mulher ainda tem de provar mais para ser reconhecida como líder?
Para mim, o sucesso mede-se pelo orgulho que os meus filhos têm em mim. O sucesso mede-se pela capacidade de transformar positivamente a vida dos outros, de gerar impacto sem perder a integridade e de manter-se fiel à missão que nos move. Infelizmente, ainda sinto que muitas mulheres têm de provar mais – não só competência, mas também firmeza, disponibilidade e resiliência. É um duplo esforço que urge desconstruir, promovendo uma cultura de equidade e reconhecimento real.

Enquanto Presidente da Sociedade Portuguesa de Medicina Integrativa, como tem utilizado essa posição de destaque para promover uma visão mais humanista, inclusiva e feminina na medicina em Portugal?
Assumir a presidência da SPMI tem sido uma oportunidade de amplificar vozes, integrar saberes e romper com visões fragmentadas da saúde. Tenho procurado construir uma plataforma onde a ciência, a humanização e a equidade caminham lado a lado. A dimensão feminina manifesta-se na forma como escutamos os nossos associados, valorizamos práticas integrativas e promovemos uma saúde mais empática e inclusiva — para todos, sem exceção.

Por fim, qual é a sua maior missão enquanto mulher, líder e médica? E que legado gostaria de deixar?
A minha missão é contribuir para uma medicina mais humana, centrada na pessoa e nos seus contextos, onde corpo fisico, emoções e crenças sejam respeitados. 
Quero ser uma ponte entre o conhecimento científico e o cuidado integral. O legado que gostaria de deixar é o de uma liderança que abriu caminhos, que valorizou a presença feminina com coragem e sensibilidade, e que inspirou outros a acreditar que é possível curar com ciência, compaixão e propósito.

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